Em 2003 a Constituição Federal foi alterada pela Emenda Constitucional
nº 42/2003. A modificação implementada autorizou a substituição gradual, total
ou parcial, da contribuição do empregador incidente sobre a folha de salário,
por contribuição incidente sobre a receita ou o faturamento (§ 13 do art. 195
da CF/88, incluído pela EC 42/2003).
Para atender a determinação constitucional foi editada a Lei nº
12.546/2011, que criou a contribuição previdenciária incidente sobre a receita
bruta – CPRB – para alguns setores da economia, tais como hoteleiro, moveleiro,
aéreo, plástico, dentre outros.
Alguns contribuintes, com dúvidas quanto a amplitude da base de cálculo
da nova contribuição, apresentaram consultas à Receita Federal para que esta
definisse os itens que englobariam a receita bruta.
Sobreveio a “Solução de Consulta nº 45 de 14 de Junho de 2012” – Disit
4, estabelecendo que a base de cálculo da CPRB inclui não apenas os valores
decorrentes da venda de bens e serviços, mas todos os ingressos de qualquer
outra natureza auferidos pela pessoa jurídica, independentemente de sua
denominação ou de sua classificação contábil, sendo irrelevante o tipo de
atividade exercida pela empresa, conforme transcrição:
“Para os fins da citada CPRB, considera-se receita bruta o valor
percebido na venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia,
bem como o ingresso de qualquer outra natureza auferido pela pessoa jurídica,
independentemente de sua denominação ou de sua classificação contábil, sendo
irrelevante o tipo de atividade exercida pela empresa. Porém, não integram tal
base de cálculo: a) as vendas canceladas; b) os descontos incondicionais
concedidos; c) o valor do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI
destacado em nota fiscal, e d) o valor do Imposto sobre Operações relativas à
Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte
Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS devido pelo vendedor dos
bens ou prestador dos serviços na condição de substituto tributário, desde que
destacado em documento fiscal” (parte da “Solução de Consulta nº 45 de 14 de Junho
de 2012” – destaques nossos).
No entanto, a decisão está equivocada, pois não é isto que de depreende
da leitura das normas que tratam do tema.
A Lei nº 12.546/2011 pretende que a CPRB incida sobre a receita bruta,
que compreende apenas o produto da venda de bens e serviços, com a exclusão de
alguns itens, tais como, vendas canceladas, descontos incondicionais, IPI,
ICMS, receita de exportações.
Partimos para análise das normas:
O artigo 8o Lei nº 12.546/2011
estabelece que algumas empresas fabricantes, tais como, de autopeças, têxtil,
móveis, plásticos, dentre outras, contribuirão sobre o valor da receita bruta,
excluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos, à
alíquota de 1% (um por cento).
Esclarece, ainda, no § 1º, que a contribuição aplica-se apenas em
relação aos produtos industrializados pela empresa; e que não se aplica a
empresas que se dediquem a outras atividades, além das previstas na lei, cuja
receita bruta decorrente dessas outras atividades seja igual ou superior a 95%
(noventa e cinco por cento) da receita bruta total. Eis o dispositivo:
“Art. 8o Até 31 de dezembro de
2014, contribuirão sobre o valor da receita bruta, excluídas as vendas
canceladas e os descontos incondicionais concedidos, à alíquota de 1% (um por
cento), em substituição às contribuições previstas nos incisos I e III do art.
22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, as empresas que fabricam os
produtos classificados na Tipi, aprovada pelo Decreto nº 7.660, de 23 de
dezembro de 2011, nos códigos referidos no Anexo desta lei.
§ 1o O disposto no caput:
I – aplica-se apenas em relação
aos produtos industrializados pela empresa;
II – não se aplica:
a) a empresas que se dediquem a
outras atividades, além das previstas no caput, cuja receita bruta decorrente
dessas outras atividades seja igual ou superior a 95% (noventa e cinco por
cento) da receita bruta total”
Por outro lado, a lei determinou que a CPRB irá incidir sobre a receita
de determinadas atividades econômicas realizadas por algumas empresas. Vale
dizer, a CPRB incide sobre a receita das atividades
mencionadas na lei que a criou e nada mais.
Tanto é assim, que a empresa que tiver outras atividades não
relacionadas na Lei nº 12.546/2011 que criou a CPRB, deverá calcular e recolher
sobre demais receitas a contribuição previdenciária incidente sobre a folha de
salários. Isto está claro no § 1o , do artigo 9º da lei, que enuncia que, no
caso de empresas que se dedicam a outras atividades além das previstas, a
contribuição previdenciária incidirá da seguinte forma:
- Sobre a receita da atividade relacionada na lei (ex. atividade
moveleira), incidirá a CPRB (inciso I, do § 1o , do artigo 9º)
- Sobre as demais receitas oriundas de atividades não relacionadas na
lei, será recolhida a contribuição previdenciária incidente sobre a folha de
salário (inciso II, do § 1o , do artigo 9º). Eis o teor do dispositivo:
“Art. 9o (…)
§ 1o No caso de empresas que se
dedicam a outras atividades além das previstas nos arts. 7o e 8o, até 31 de
dezembro de 2014, o cálculo da contribuição obedecerá:
I – ao disposto no caput desses
artigos quanto à parcela da receita bruta correspondente às atividades neles
referidas; e
II – ao disposto no art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991,
reduzindo-se o valor da contribuição a recolher ao percentual resultante da
razão entre a receita bruta de atividades não relacionadas aos serviços de que
trata o caput do art. 7o ou à fabricação dos produtos de que trata o caput do
art. 8o e a receita bruta total, apuradas no mês.”
É importante ressaltar que o próprio Ministério da Fazenda publicou a
chamadas “Cartilha de desoneração” na qual profere este exato entendimento:
“Se uma empresa produzir tipos diferentes de produtos ou prestar
diferentes tipos de serviços, sendo apenas alguns deles elencados na Medida
Provisória, então ela deverá proporcionalizar sua receita de acordo com os
serviços/produtos enquadrados e não-enquadrados na Medida Provisória e recolher
a contribuição previdenciária em duas guias: uma parcela sobre a receita e
outra parcela sobre a folha”
(…)
“Se, por exemplo, uma empresa tiver 70% de sua receita derivada de
produtos enquadrados na Medida Provisória e 30% de fora, então ela deverá
recolher a alíquota de 1% sobre 70% de sua receita e aplicar a alíquota
previdenciária normal, de 20%, sobre 30% de sua folha salarial.
Digamos que a receita de uma empresa nesta situação seja de 1000 e sua
folha de salários de 200. Atualmente, essa empresa recolhe 20% de 200, pagando
40 de contribuição previdenciária. Pela nova sistemática, ela pagará 19 (1% x
70% x 1000 + 20% x 30% x 200)”
(http://www.fazenda.gov.br/portugues/documentos/2012/cartilhadesoneracao.pdf)
Como se vê, a CPRB incide apenas sobre a receita das atividades
elencadas na lei e não há como se pretender ampliar a base de cálculo para
incluir “o ingresso de qualquer outra
natureza auferido pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou
de sua classificação contábil, sendo
irrelevante o tipo de atividade exercida pela empresa”, como quer a Solução de
Consulta 45.
De se lembrar, ainda, que o Supremo Tribunal Federal tem reiterado
constantemente o seu entendimento de que receita bruta, que é a base de cálculo
da CPRB, compreende o valor auferido com a venda de mercadorias e serviços,
conforme precedente recentíssimo que se transcreve:
“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PARA
O PIS E COFINS. BASE DE CÁLCULO. EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS
TERCEIRIZADOS. INCIDÊNCIA. PRECEDENTES.
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende que receita
bruta e faturamento são sinônimos, significando ambos o total dos valores
auferidos com a venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços.
Precedentes.
2. Agravo regimental desprovido”.
(RE 656284 AgR, Relator: Min.
Ayres Britto, Segunda Turma, julgado em 28/02/2012, Processo Eletrônico
DJe-121, divulgado 20-06-2012 e publicado 21-06-2012)
Além disso, o conceito de receita bruta, segundo o Regulamento do
Imposto de Renda – RIR/99 – compreende apenas as receitas das venda de bens e
serviços:
“Receita Bruta
Art. 279. A receita bruta das
vendas e serviços compreende o produto da venda de bens nas operações de conta
própria, o preço dos serviços prestados e o resultado auferido nas operações de
conta alheia (Lei nº 4.506, de 1964, art. 44, e Decreto-Lei nº 1.598, de 1977,
art. 12).
Parágrafo único. Na receita bruta
não se incluem os impostos não cumulativos cobrados, destacadamente, do
comprador ou contratante, dos quais o vendedor dos bens ou o prestador dos
serviços seja mero depositário”.
Fonte: Tributário nos Bastidores
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